Diferentemente do CPC/73, no qual a boa-fé aparecia expressamente apenas no art. 14, inciso II, que tratava dos deveres dos sujeitos processuais, no texto do CPC, a expressão é referida em pelo menos três dispositivos distintos, quais sejam: (i) artigo 5º – como dever de todo e qualquer sujeito do processo; (ii) artigo 322, § 2º – como princípio norteador da interpretação do pedido formulado; e (iii) artigo 489, § 3º – como princípio norteador da interpretação das decisões judiciais.

Dessa forma, verifica-se que a boa-fé objetiva, seus deveres anexos (deveres de respeito, confiança, lealdade, cooperação, honestidade, razoabilidade etc.) e seus conceitos parcelares (supressio, surrectio, tu quoque, exceptio doli, venire contra factum proprium non potest e duty to mitigate the loss), muito caros aos civilistas (Cf. Flávio TARTUCE. Manual de Direito Civil. p. 581 e ss), ganham importância central também para a Teoria Geral do Processo.

Sobretudo a partir da publicação do Código Civil de 2002, os tribunais brasileiros passaram a prestigiar a boa-fé no campo do direito material, posicionando-a como tema principal dentro da teoria geral dos contratos. Eis o Enunciado nº 26 da I Jornada de Direito Civil do STJ/CJF:

A cláusula geral contida no art. 422 do novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como exigência de comportamento leal dos contratantes.

No campo do direito processual, também já se encontram decisões do Superior Tribunal de Justiça utilizando o princípio da boa-fé para interpretar a conduta das partes (STJ, REsp 1.119.361/RS, 3ª T., j. 06.05.2014, rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 19.05.2014). Nesse sentido, é dever dos sujeitos processuais se comportar conforme a boa-fé, expressando a verdade em suas manifestações, colaborando para com a rápida solução do litígio (v. CPC, art. 6º) e utilizando sem abuso os seus poderes processuais (STJ, AgInt no AgInt no REsp 1624831/SC, 2ª T., j. 17.08.2017, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 23.08.2017).

A litigância de má-fé permanece na nova sistemática com as mesmas hipóteses já existentes no antigo art. 17 do CPC/73 (v. CPC, art. 80, I a VII). O teto para a multa, entretanto, em vez de 1% do valor da causa, foi para 10% do valor corrigido da causa (ou 10 salários mínimos nos casos de valor da causa irrisório ou inestimável), além da possível indenização para a parte prejudicada (CPC, art. 81).

Por fim, cabe ressaltar que o CPC vai além, trazendo o princípio da boa-fé também para o campo hermenêutico, a nortear a interpretação dos pedidos formulados perante o Judiciário e das próprias decisões judiciais.

Isso trará efeitos práticos sobretudo no âmbito recursal, no qual o tribunal deverá decidir desde logo o mérito quando, por exemplo, interposta a apelação e a causa estiver em condições de imediato julgamento, decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir (v. CPC, art. 1013, § 3º, II).

Também para a hipótese de ajuizamento de ação rescisória fundada em violação manifesta de norma jurídica (v. CPC, art. 966, V), o princípio da boa-fé, como norma jurídica que é, poderá ser invocado como fundamento para a rescisão.