Muitas dúvidas giram em torno da aplicação supletiva e subsidiária do CPC aos demais ramos do Direito.
Nesse sentido, sem a pretensão de detalhar todas as nuances que esse amplo tema envolve, não se pode deixar de registrar algumas observações acerca do artigo 15 do CPC, que assim dispõe expressamente: “Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”.
De início, cumpre destacar a pertinente observação de Teresa ARRUDA ALVIM, Maria Lúcia Lins CONCEIÇÃO, Leonardo Ferres da Silva RIBEIRO e Rogerio Licastro Torres de MELLO:
Não se trata somente de aplicar as normas processuais aos processos administrativos, trabalhistas e eleitorais quando não houver normas, nestes ramos do direito, que resolvam a situação. A aplicação subsidiária ocorre também em situações nas quais não há omissão. Trata-se, como sugere a expressão “subsidiária”, de uma possibilidade de enriquecimento, de leitura de um dispositivo sob outro viés, de extrair-se da norma processual eleitoral, trabalhista ou administrativa um sentido diferente, iluminado pelos princípios fundamentais do processo civil. A aplicação supletiva é que ocorre apenas quando há omissão. Aliás, o legislador, deixando de lado a preocupação com a própria expressão, precisão da linguagem, serve-se das duas expressões. Não deve ter suposto que significam a mesma coisa, senão, não teria usado as duas. Mas como empregou também a mais rica, mais abrangente, deve o intérprete entender que é disso que se trata. (…). (Primeiros comentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo, comentários ao art. 15, p. 84).
Superada essa questão terminológica de clara influência pragmática, insta ressaltar que a autorização expressa para a aplicação supletiva e subsidiária do CPC já existe, por exemplo, no artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como no artigo 3º do Código de Processo Penal (sobre a aplicação do CPC no que se refere à contagem de prazos penais, o STJ já se manifestou no sentido de não se aplica a regra da contagem em dias úteis, cf.: STJ, AgRg nos EAREsp 828.271/SC, 3ª S., j. 22.03.2017, rel. Min. Jorge Mussi, DJe 30.03.2017).
Como não houve previsão expressa no CPC em relação ao processo penal, ressalta-se o comentário de Cassio Scarpinella BUENO:
(…) A questão, pertinentíssima, é saber se, não obstante este silêncio, a aplicação continua a ser autorizada pelo art. 3º do CPP. A melhor resposta parece ser a positiva, o que se justifica até mesmo pela amplitude do texto da referida regra processual penal. De resto, nos casos em que o Código de Processo Penal faz expressa remissão ao Código de Processo Civil (art. 139 [depósito e administração de bens arrestados]; art. 362 [citação por hora certa]; e art. 790 [homologação de sentença estrangeira]), é irrecusável o prevalecimento da disciplina trazida pelo CPC de 2015. (Novo Código de Processo Civil Anotado, p. 83).
Em relação aos processos eleitorais, importantíssimo o papel do CPC, por exemplo, nos procedimentos voltados à tutela cautelar (agora tutela de urgência de natureza cautelar) e nos recursos eleitorais, conforme decisões do TSE nesse sentido (REsp. 4221719/RN, j. 11.09.2014, rel. Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, rel. designado Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, DJe 01.10.2014; e, mais recentemente AgRg em REsp. 10462/MG, j. 16.11.2016, rel. Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, PSESS 16.11.2016). Repita-se que o artigo 1.067 do Código alterou a redação do artigo 275 do Código Eleitoral (Lei Federal nº 4.737/65), a fim de uniformizar o tratamento dos embargos de declaração no processo eleitoral.
No âmbito do processo do trabalho, destacam-se também os artigos 836 (ação rescisória), 896, § 3º (dever de uniformização da jurisprudência por parte dos TRTs), 896-B (recursos de revista repetitivos), 896-C, §§ 8º (amicus curiae na Justiça do Trabalho) e 14 (recurso extraordinário interposto perante o TST), todos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Em 15 de março de 2016, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) editou a Resolução nº 203 que, por sua vez, aprovou a Instrução Normativa nº 39/2016, que “Dispõe sobre as normas do Código de Processo Civil de 2015 aplicáveis e inaplicáveis ao Processo do Trabalho, de forma não exaustiva”, a fim de auxiliar os operadores do direito nessa árdua tarefa de reinterpretação do processo do trabalho à luz do CPC.
Por fim, quanto ao processo administrativo, inegável a aplicação dos dispositivos relacionados às modalidades de intervenção de terceiros (com as necessárias adaptações) e também das garantias processuais, notadamente em relação aos processos administrativos disciplinares (cf. RMS 29.036/ES, 1ª T., j. 03.03.2011, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 16.03.2011).
Não há dúvidas de que a Parte Geral do CPC, ao tratar das “Normas Fundamentais do Processo Civil”, pretende-se mais abrangente e direcionada, em muitos pontos, à conformação de premissas de uma Teoria Geral do Processo revisitada, que certamente encontrará espaço em todos os “tipos” de processos, até por razões de uniformidade e respeito aos ditames constitucionais pertinentes.