O IDC começa o ano analisando um importante e inovador instituto criado pelo Código de Processo Civil de 2015, qual seja: o incidente de resolução de demandas repetitivas, que ficou conhecido como IRDR.
Tratado pelo Código nos artigos 976 a 987, o regramento do IRDR se insere como um Capítulo do Título que cuida “Da Ordem dos Processos e Dos Processos de Competência Originária dos Tribunais”, já no Livro III do NCPC.
Concebido pela nova sistemática como uma forma de julgamento de casos repetitivos com decisão vinculante para os casos presentes e futuros que tratem da mesma matéria (v. arts. 927, inciso III e 928, inciso I – ainda que haja discussão doutrinária atual sobre a constitucionalidade do inciso III do art. 927), o IRDR tem cabimento diante de presença de 02 requisitos básicos, quais sejam: i) efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; e ii) risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica (art. 976, incisos I e II).
Percebe-se, desde logo, que se trata de instituto vocacionado à eliminação de diversas demandas que estejam em trâmite e versem sobre a mesma questão de direito. Busca-se, portanto, de certa forma, antecipar o julgamento dessas causas por meio de um procedimento com finalidade muito próxima à do já conhecido julgamento de recursos especiais e extraordinários repetitivos (v. NCPC, arts. 1.036 a 1.041).
Ainda que existam diversas diferenças procedimentais, o que se procura em ambos é definir a tese jurídica aplicável a um conjunto de demandas, estejam elas representadas por um grupo de demandas repetitivas ou por dois ou mais recursos especiais ou extraordinários escolhidos como representativos da controvérsia.
Quer-se proteger a isonomia e a segurança jurídica, tratando da mesma forma situações jurídicas idênticas, o que, de fato, parece elementar num sistema jurídico seriamente estruturado.
De acordo com o art. 982, inciso I, superado o juízo de admissibilidade pelo órgão indicado no Regimento Interno para essa tarefa, o Relator do IRDR no tribunal “suspenderá os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região, conforme o caso” (v. também o art. 313, inciso IV). Lembre-se, ainda, que, consoante o §3º do mesmo dispositivo legal, as partes, o Ministério Público ou a Defensoria Pública, por petição, poderão requerer ao STJ e STF a ampliação desse efeito suspensivo a todas as demandas individuais ou coletivas que tramitem em território nacional e que versem sobre a mesma questão discutida no IRDR.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por exemplo, começou o ano de 2017 com 05 IRDRs admitidos, conforme informações que podem ser facilmente encontradas em seu endereço eletrônico (http://www.tjsp.jus.br/Nurer/
No âmbito do julgamento de admissibilidade do IRDR 04-TJ/SP, que trata de 09 temas relacionados aos requisitos e efeitos do atraso na entrega de unidades autônomas em construção aos consumidores, o Relator, Desembargador Francisco Loureiro, propôs a tramitação do incidente sem a suspensão dos processos que tratam das mesmas questões de direito no território paulista.
Conforme sustentou o Relator em seu voto, acompanhado pela maioria de seus pares em relação a esse item no acórdão da Turma Especial – Privado 1 daquele tribunal, “A paralisação de todos os processos do Estado de São Paulo por até um ano provocaria efeito inverso à celeridade e segurança que o instituto do IRDR almeja. Para fins de evitar a instabilidade e insegurança jurídica de franca minoria de julgamentos dissonantes, seria suspensa a maioria dos julgamentos que se filiam ao entendimento já sumulado.”.
Como se percebe, a argumentação utilizada foi no sentido de que a paralisação de inúmeras demandas que já estão sendo decididas de acordo com entendimentos sumulados pelo TJ/SP causaria mais prejuízo e instabilidade, já que poucos são os julgamentos dissonantes.
Por outro lado, deve-se também ponderar que o tribunal não é obrigado (embora seja recomendável) a seguir e manter os seus entendimentos já consolidados. O que o NCPC exige nos casos de mudança é uma fundamentação adequada e profunda, tendo em vista que não se pode frustrar expectativas legítimas da sociedade que se pauta de acordo com algo que estava sumulado, por exemplo (v. art. 927, §§2º a 4º).
Especificamente sobre esse caso que tramita junto ao TJ/SP, como já dito, a decisão por maioria foi no sentido de que o julgamento de mérito do IRDR prosseguisse excepcionalmente sem a suspensão das demandas no território bandeirante que tratam da matéria.
O andamento do caso na íntegra, atualmente já com a participação de alguns amici curiae, pode ser acessado pelo seguinte link: http://bit.ly/2jkCGf6