Uma das novidades do Código de Processo Civil foi a possibilidade de o juiz decidir parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados, ou parcela deles, mostrarem-se incontroversos ou estiverem em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 356.

Dessa decisão que julga antecipada e parcialmente o mérito, o legislador autoriza a recorribilidade imediata por meio de agravo de instrumento, conforme inciso II do art. 1.015 do Código.

Contudo, segundo interpretação recente do Superior Tribunal de Justiça, o legislador só teria contemplado a possibilidade de recorribilidade imediata das decisões que apreciam expressa e especificamente o mérito, acolhendo ou não parcialmente a pretensão formulada pela parte.

Ou seja, as decisões que rejeitam o requerimento de julgamento parcial do mérito, determinando, por exemplo, o prosseguimento do feito por demandar eventual dilação probatória para apuração do referido pedido, não desafiariam o recurso de agravo de instrumento e, portanto, seriam impugnáveis apenas após a prolação da sentença (art. 1.009, §1º, do CPC).

Esse foi o entendimento fixado no julgamento do AgInt no AREsp 1.411.485/SP, pela Terceira Turma do STJ, no caso em que a decisão interlocutória não enfrenta o mérito e defere a produção de prova justamente por entender pela necessária dilação probatória para julgamento do pedido.

Vejamos:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO CONTRA DECISÃO QUE, NO CASO, FIXOU PONTO CONTROVERTIDO E DEFERIU A PRODUÇÃO DE PROVAS. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 356, I E II, § 5º, C/C O ART. 1.015, II, DO CPC/2015. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO § 4º DO ART. 1.021 DO NCPC. NÃO CABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO.

(…)

Consoante dispõe o art. 356, caput, I e II, e § 5º, do CPC/2015, o juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrarem-se incontroversos ou estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355, sendo a decisão proferida  com  base  neste artigo impugnável por agravo de instrumento.

No caso, conforme asseverou o acórdão recorrido, a decisão do Juízo singular não ingressou no mérito, justamente porque entendeu pela necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial. Logo, não havendo questão incontroversa que possibilitasse a prolação de decisão de mérito, inviável se falar, por conseguinte, na impugnação do referido decisum por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada a hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015.

(…)

Agravo interno desprovido.

(STJ, AgInt no AREsp 1.411.485/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, julgado em 01/07/2019, DJe do dia 06/08/2019) – Grifo nosso

É importante considerar, ademais, que existem julgados de tribunais de segundo grau que admitem a interposição do agravo de instrumento contra decisões que rejeitam o julgamento parcial de mérito e determinam a dilação probatória, fundada na tese da taxatividade mitigada fixada pelo Superior Tribunal de Justiça (v. STJ, REsp nº 1.704.520/MT), por entender que existiria urgência na apreciação dessa matéria naquele momento processual.

Senão, vejamos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. 

Decisão agravada que rejeita o pedido de julgamento antecipado de parcela dos pedidos, saneia o processo e determina produção de provas. Pedido de reforma para que se resolva, em grau de recurso, parcela do mérito no que tange à resolução do contrato celebrado entre as partes e, em consequência, seja determinada a restituição das cotas sociais negociadas e a perda do sinal pago pelo agravado. CABIMENTO DO RECURSO. Admissibilidade do agravo em virtude da subsunção ao conceito de urgência adotado pelo STJ (REsp. n. 1.704.520/MT). Inutilidade da apreciação do pedido dos agravantes por ocasião da apelação. RESOLUÇÃO PARCIAL DE MÉRITO. Art. 356 do CPC. Agravada que não realiza o pagamento do preço. Fato incontroverso. Inadimplemento que é fundamento para a declaração da resolução do contrato de cessão onerosa de quotas sociais e da operação de transporte coletivo urbano e escolar em Botucatu celebrado entre as partes, assim como seus respectivos aditivos com a consequência de que as cotas sociais alienadas devem ser revertidas aos vendedores, que retornam ao quadro social da Reta Rápido Transportes Ltda., e o sinal pago perdido em favor dos agravantes (item ii da cláusula 9.7 do contrato). Decisão reformada. Recurso provido.

(TJSP, Agravo de Instrumento nº 2106361-17.2017.8.26.0000, Rel. Des. Hamid Bdine, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, julgado em 21/08/2019, DJe 30/08/2019)

Desse modo, prezado leitor, mesmo considerando recente interpretação do Superior Tribunal de Justiça acerca do não cabimento do agravo de instrumento em face de decisão interlocutória que rejeita a apreciação parcial do mérito e determina a produção de prova, cada caso deverá ser avaliado na sua especificidade, tendo em vista a possibilidade de aplicação da interpretação extensiva denominada “taxatividade mitigada” e a consequente admissão do recurso, caso seja demonstrada a urgência na reapreciação da matéria e eventual inutilidade da revisão em sede de apelação ou contrarrazões – isso, sim, é importante sempre destacar na peça processual.

EQUIPE IDC (Luiz Cezare e Felipe Moreira)