Importantes orientações sobre a estabilização da tutela antecipada antecedente estabelecidas pelo Superior Tribunal de Justiça

Por Luiz Cezare

De acordo com os artigos 303 e 304, ambos do Código de Processo Civil, nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, o autor poderá requerer a tutela antecipada em caráter antecedente, limitando-se, na petição inicial, a formular o requerimento da tutela antecipada e indicar o pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito pleiteado e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.

Na hipótese de deferimento: (i) o autor deverá, no prazo de 15 dias (ou outro maior que o juiz fixar), aditar a petição inicial com a complementação de sua argumentação e confirmação do pedido principal (art. 303, § 1º, inciso I, do CPC); (ii) e o réu, caso pretenda impedir a estabilização decisão antecipatória, deverá interpor o respectivo recurso (art. 304, caput, do CPC).

Sobre esse tema, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça enfrentou duas importantes questões, quais sejam: (i) os prazos para recorrer e para interpor recurso, ambos de 15 dias, são subsequentes ou concomitantes? e (ii) se o autor precisa ser especificamente intimado para promover o aditamento da petição inicial.

Vejamos a ementa do referido julgado:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TUTELA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE. PROCEDIMENTO. ARTS. 303 E 304 DO CPC/15. ADITAMENTO DA INICIAL. INTIMAÇÃO ESPECÍFICA. PRINCÍPIOS DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO E DA ECONOMIA PROCESSUAL. ARTS. 4º, 139, IX, 321, CAPUT, 304, CAPUT E § 1º, e 1.003, § 5º, do CPC/15. PETIÇÃO. JUNTADA. CONTEÚDO. CONHECIMENTO INEQUÍVOCO. HIPÓTESE CONCRETA. NÃO CARACTERIZAÇÃO.

(…)

  1. O propósito recursal consiste em determinar se a juntada de petição pelo autor após a concessão da tutela antecipada antecedente é apta a: a) configurar a ciência inequívoca da parte a respeito de seu conteúdo e; b) demarcar o início do prazo de 15 (quinze) dias para o aditamento da petição inicial previsto no art. 303, § 1º, I, do CPC/15.
  2. Nosso direito processual civil é instrumental e adota o sistema da legalidade das formas, de modo que é preciso que seu rigorismo formal seja observado com vistas a se oferecer segurança jurídica e previsibilidade à atuação do juiz e das partes, sendo abrandado quando o ato atingir a finalidade que motiva sua vigência.
  3. A intimação das partes acerca dos conteúdos decisórios é indispensável ao exercício da ampla defesa e do contraditório, pois somente o conhecimento dos atos e dos termos do processo permite a cada litigante encontrar os meios necessários e legítimos à proteção de seus interesses.
  4. No processo eletrônico, a ciência pessoal de todo o conteúdo do processo é presumida, em regra, com a intimação formal. Precedente.
  5. Excepciona-se essa regra na juntada superveniente de petição cujo conteúdo revele a indispensável ciência de todo o conteúdo decisório, isto é, o inequívoco conhecimento da decisão e a plena ciência da parte de que deve tomar alguma atitude processual. Precedentes.
  6. No CPC/15, a tutela provisória passa a ser uma técnica aplicada na relação processual de conhecimento ou de execução, mas que, na forma do art. 303, pode ser também requerida em caráter antecedente à própria formação da relação jurídica processual da tutela definitiva.
  7. O propósito da previsão dos arts. 303 e 304 do CPC é, especificamente, proporcionar oportunidade à estabilização da medida provisória satisfativa, valorizando a economia processual por evitar o desenvolvimento de um processo de cognição plena e exauriente, quando as partes se contentarem com o provimento sumário para solucionar a lide.
  8. O procedimento da tutela provisória é, portanto, eventualmente autônomo em relação à tutela definitiva, pois, para a superação dessa autonomia, é preciso que o requerido recorra da decisão que concede a antecipação da tutela, sob pena de a tutela estabilizar-se e o processo ser extinto.
  9. Como, na inicial da tutela antecipada antecedente, o autor somente faz a indicação do pedido de tutela final, existe a previsão de que deve complementar sua argumentação, com a confirmação do pedido de tutela final, no prazo de 15 (quinze) dias ou outro maior fixado pelo juiz.
  10. Os prazos do requerido, para recorrer, e do autor, para aditar a inicial, não são concomitantes, mas subsequentes.
  11. Solução diversa acarretaria vulnerar os princípios da economia processual e da primazia do julgamento de mérito, porquanto poderia resultar na extinção do processo a despeito da eventual ausência de contraposição por parte do adversário do autor, suficiente para solucionar a lide trazida a juízo.
  12. Como a interposição do agravo de instrumento é eventual e representa o marco indispensável para a passagem do “procedimento provisório” para o da tutela definitiva, impõe-se a intimação específica do autor para que tome conhecimento desta circunstância, sendo indicada expressa e precisamente a necessidade de que complemente sua argumentação e pedidos.

(…)

  1. Além disso, a intimação do autor para o aditamento da inicial e o início do prazo de 15 (quinze) dias para a prática desse ato, previstos no art. 303, § 1º, I, do CPC/15, exigem intimação específica com indicação precisa da emenda necessária, como realizado pelo juízo do primeiro grau de jurisdição.
  2. Recurso especial desprovido.

(REsp nº 1.766.376/TO, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 28/08/2020).

Segundo a relatora, apesar da aparente contradição entre os prazos de recurso do réu (para impedir a estabilização) e de aditamento da petição inicial do autor (para impedir a extinção do processo), ambos os prazos não são concomitantes, mas sim subsequentes, visto que, considerando que o aditamento somente seria necessário para dar sequência do procedimento provisório ao procedimento da tutela principal, atentaria contra os princípios da economia e da primazia do julgamento de mérito impor que o autor aditasse a petição inicial sem antes saber se o réu recorreu da decisão e impediu a estabilização da tutela.

Por outro lado, restou consignado também que, tendo em vista o caráter subsequente dos prazos, o autor precisa ser intimado especificamente para que tome conhecimento da eventual interposição do recurso pelo réu – e, por consequência, do impedimento da estabilização da tutela e prosseguimento do procedimento – e adite a petição inicial, nos termos do art. 303, § 1º, inciso I, do Código de Processo Civil.

Assim, caro, leitor, referida orientação jurisprudencial joga luzes às dúvidas interpretativas da ainda pouco explorada tutela antecipada requerida em caráter antecedente e promove maior segurança jurídica ao procedimento, protegendo o jurisdicionado de eventuais divergências que possam prejudicar o desenvolvimento da tutela jurisdicional e a efetiva entrega do bem da vida.