Sabe-se que a partir dos conceitos de supremacia e rigidez constitucionais são formadas as bases para os mecanismos de controle de constitucionalidade que, no Brasil, sob o aspecto repressivo (quando a norma inconstitucional já está dentro do sistema normativo), desenvolvem-se de modo difuso (feito por qualquer órgão do Poder Judiciário, quando da análise incidental da inconstitucionalidade no bojo de um caso concreto) ou concentrado (feito pelo STF ou pelos tribunais de justiça, a partir de ações judiciais especificamente voltadas para isso, quais sejam: ação direta de inconstitucionalidade – ADIn; ação declaratória de constitucionalidade – ADCon; e arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF – v. CF, arts. 102, I, a e § 1º e 125, § 2º).
Em quaisquer das hipóteses, deve-se observar a conhecida “cláusula de reserva de plenário”, regra insculpida no art. 97 do Texto Constitucional Brasileiro (“Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”).
Ao lado das conhecidas regras infraconstitucionais que norteiam o controle repressivo concentrado de constitucionalidade (cf. Leis Federais nº 9.868/99 e 9.882/99), coube ao Código de Processo Civil revisitar a matéria no tocante à regulamentação do controle repressivo difuso de constitucionalidade (v. CPC/73, arts. 480 a 482), bem como da estrita obediência à regra da reserva de plenário quando se tratar do pronunciamento de um órgão judicial colegiado (v. Enunciado nº 10, da Súmula Vinculante do STF).
Dessa forma, aparece nos arts. 948 a 950 do Código a sistemática procedimental necessária à declaração incidental (incidenter tantum) da inconstitucionalidade via controle difuso, por meio da instauração de um incidente próprio e voltado a essa finalidade.
Em resumo: quando um órgão judicial colegiado se depara com a necessidade de enfrentar uma arguição de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público no âmbito de uma demanda qualquer, ocorrerá uma cisão no julgamento, isto é, a questão da inconstitucionalidade será levada para análise do plenário do tribunal ou de seu respectivo órgão especial, enquanto o mérito da demanda será posteriormente decidido pelo competente órgão fracionário, a partir da obrigatória observância daquilo que ficou assentado pelo plenário ou órgão especial em relação à prejudicial de inconstitucionalidade.
Daí porque aponta a doutrina, nesse caso, para um julgamento subjetiva e objetivamente complexo, dado que a decisão final (e, portanto, o acórdão recorrível – v. Enunciado nº 513, da Súmula do STF), será necessariamente formada pela composição de duas decisões judiciais proferidas por órgãos jurisdicionais distintos (plenário ou órgão especial e órgão fracionário – complexidade subjetiva) sobre questões igualmente distintas (constitucionalidade e mérito – complexidade objetiva).
As hipóteses de dispensa da instauração do incidente de arguição de inconstitucionalidade estão descritas no art. 949, parágrafo único: (i) quando já houver pronunciamento do plenário do tribunal ou do respectivo órgão especial sobre a questão; e (ii) quando já houver pronunciamento do plenário do STF sobre a questão.
Discute-se, quanto a essa última hipótese de dispensa, se a decisão do STF deveria ser fruto de decisão proferida no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade ou manifestada por meio de súmula vinculante (pois somente nesses dois casos haveria vinculação prevista pela norma constitucional), ou se bastaria a manifestação do plenário do STF, ainda que em controle incidental, dentro de sua competência recursal comum.
Apesar de forte corrente doutrinária defendendo a vinculação somente diante de decisões em ADIns, ADCons, ADPFs e súmulas vinculantes, o próprio STF tem entendimento contrário, ampliando os efeitos de decisões tomadas no âmbito do controle difuso de constitucionalidade (cf. STF, EDcl no ARE 736.946/RS, 2ª T., j. 23.09.2014, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 13.10.2014 e AgRg no RE 370.765/RS, 1ª T., j. 08.02.2011, rel. Min. Marco Aurélio, DJe 11.03.2011).
Por fim, cabe destacar a possibilidade de intervenção de amici curiae (art. 138) no incidente de arguição de inconstitucionalidade quando da sessão de julgamento do plenário ou do órgão especial (art. 950, § 3º), prestigiando essa necessária ampliação do debate a fim de legitimar uma decisão judicial que servirá como parâmetro para futuras demandas que tratem incidentalmente da mesma questão de constitucionalidade (efeito prospectivo – art. 949, parágrafo único).