Erro grosseiro na interposição de recurso impede o trânsito em julgado?

Por Luiz Cezare e Felipe Moreira

Os recursos especial e extraordinário deverão ser interpostos perante a presidência ou vice-presidência do tribunal recorrido, que também fará o primeiro juízo de admissibilidade, nos termos dos arts. 1.029 e 1.030 do CPC, com as alterações trazidas ainda no período de vacatio legis do Código pela Lei Federal nº 13.256/2016.

Trata-se de regra que já era prevista no Código de 1973 (art. 541).

Diante disso, o Superior Tribunal de Justiça, recentemente, analisou requerimento da parte recorrente que pretendia a admissão do recurso especial que fora interposto diretamente perante a Corte Superior, sob a justificativa de que a mudança do sistema físico para o digital poderia causar algumas distorções e equívocos, devendo ser relevados atos desta natureza que não demonstrarem má-fé, vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO DIRETAMENTE NO STJ. ERRO GROSSEIRO. NÃO CONHECIMENTO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

  1. O recurso especial deve protocolado no tribunal de origem, constituindo erro grosseiro a sua interposição diretamente no STJ (art. 1.029 do CPC/2015).
  2. Agravo interno desprovido.

(AgInt no REsp nº 1.852.513/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe 03/08/2020).”

Em seu voto, o ministro relator consignou que a interposição do recurso especial diretamente na Corte Superior configura erro grosseiro, não sendo possível a remessa dos autos ao tribunal competente, pois não haveria previsão legal nesse sentido, comportando, portanto, inadmissão do recurso.

Esse mesmo entendimento já vem sendo aplicável pela Corte nos casos de interposição de agravo em recurso especial diretamente no Superior Tribunal de Justiça, ao invés do tribunal de segundo grau, verbis:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERPOSIÇÃO DIRETAMENTE NO STJ. ERRO GROSSEIRO. NÃO CONHECIMENTO.

  1. O agravo contra decisão que não admite recurso especial deve protocolado no tribunal de origem, constituindo erro grosseiro a sua interposição diretamente no STJ (CPC, art. 544, § 2º).
  2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no Ag 1.431.878/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 23/05/2013)

Interessante notarmos que, por considerar erro grosseiro, o Superior Tribunal de Justiça já declarou a intempestividade de recurso interposto em outro processo e que posteriormente foi apresentado no processo correto, porém, quando já transcorrido o prazo recursal, vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EM PROCESSO DIVERSO. ERRO DA PARTE. POSTERIOR JUNTADA EXTEMPORÂNEA NOS AUTOS CORRETOS. INTEMPESTIVIDADE. RECONHECIMENTO. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA.

  1. O protocolo de recurso pela parte em processo diverso configura erro grosseiro. Desse modo, a juntada da peça aos autos corretos após o decurso do prazo recursal implica o reconhecimento da intempestividade da impugnação. Precedentes.
  2. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 1.628.993/MG, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe 14/08/2020)

Da mesma forma, o STJ também entende erro grosseiro a interposição do agravo previsto no art. 1.042, caput, do CPC, quando a Corte de origem o inadmitir com base em recurso repetitivo:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO PUBLICADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. 1. IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA (CPC/2015, ART 932, III). NECESSIDADE. 2. PARTE DO RECURSO ESPECIAL NÃO ADMITIDA NA ORIGEM PORQUE AS MATÉRIAS FORAM JULGADAS SEGUNDO O RITO DO ART. 543-C DO CPC: TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. NÃO CABIMENTO DO AGRAVO NESSES PONTOS (CPC/2015, ART. 1.042). 3. PREVISÃO LEGAL EXPRESSA. ERRO GROSSEIRO. CARACTERIZAÇÃO. 4. RECURSO CONHECIDO APENAS QUANTO À ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/73. MÉRITO. AFASTAMENTO. 5. AGRAVO PARCIALMENTE CONHECIDO PARA, NESSA EXTENSÃO, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 85, §§ 8º E 11, DO CPC/2015.

  1. Com o advento do Código de Processo Civil de 2015 passou a existir expressa previsão legal no sentido do não cabimento de agravo contra decisão que não admite recurso especial quando a matéria nele veiculada já houver sido decidida pela Corte de origem em conformidade com recurso repetitivo (art. 1.042, caput). Tal disposição legal aplica-se aos agravos apresentados contra decisão publicada após a entrada em vigor do Novo CPC, em conformidade com o princípio tempus regit actum.
  2. A interposição do agravo previsto no art. 1.042, caput, do CPC/2015 quando a Corte de origem o inadmitir com base em recurso repetitivo constitui erro grosseiro, não sendo mais devida a determinação de outrora de retorno dos autos ao Tribunal a quo para que o aprecie como agravo interno.
  3. Não se configura ofensa ao art. 535 do CPC/73 quando o Tribunal de origem, embora rejeite os embargos de declaração opostos, manifesta-se acerca de todas as questões devolvidas com o recurso e consideradas necessárias à solução da controvérsia, sendo desnecessária a manifestação pontual sobre todos os artigos de lei indicados como violados pela parte vencida.
  4. Agravo parcialmente conhecido para, nessa extensão, negar provimento ao recurso especial, com majoração dos honorários advocatícios, na forma do art. 85, §§ 8º e 11, do CPC/2015.

(AREsp 959.991/RS, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 16/08/2016, DJe 26/08/2016)

Nesses casos, é preciso atentar para o fato de que o cometimento de erro grosseiro na interposição do recurso não impede o trânsito em julgado da decisão inadequadamente impugnada:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. BUSCA E APREENSÃO. COMPROVAÇÃO DA MORA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO A FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA.

SÚMULA 182 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). INTERPOSIÇÃO DE SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL. ERRO GROSSEIRO. INTEMPESTIVIDADE.

  1. O agravo regimental não impugnou especificamente toda a fundamentação da decisão agravada, o que atrai a incidência da Súmula 182 do STJ.
  2. A interposição de recurso manifestamente incabível não interrompe ou suspende o prazo para a interposição de outros recursos, nem impede o trânsito em julgado do acórdão ou decisão inadequadamente impugnados. Intempestividade do recurso especial. Precedentes.
  3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no AREsp 750.225/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2015, DJe 01/02/2016)

Portanto, caro leitor, no que tange à interposição recursal e ao conceito de erro grosseiro, podemos extrair duas importantes lições da atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: i) a interposição do recurso especial ou agravo em recurso especial diretamente no STJ é considerado erro grosseiro e, por isso, deve ser inadmitido; e ii) o erro grosseiro não impede o trânsito em julgado da decisão inadequadamente combatida.