Como se sabe, dentre as inovações do CPC/15 no campo das modalidades de intervenção de terceiros, estão: o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (arts. 133 a 137) e a figura enigmática do amicus curiae (art. 138).

Sobre a peculiar figura do amicus curiae, também conhecido como “amigo da Corte” ou “colaborador da Corte”, melhor do que traduzir literalmente a expressão é entender que o amicus curiae representa verdadeiro portador de interesses institucionais dispersos na sociedade, a conformar uma releitura do contraditório em questões que ultrapassam interesses meramente particulares (cf. Cassio Scarpinella BUENO, Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, especialmente p. 80 e ss.).

A ideia em si é relativamente simples: se determinada decisão irá atingir toda a coletividade, nada melhor que sejam admitidas em contraditório as pessoas, físicas ou jurídicas, que carreguem adequada representatividade para contribuir e trazer elementos informativos para a prolação de uma melhor decisão. Dessa forma, obter-se-á uma decisão melhor “informada” e consequentemente, que gozará de maior legitimidade democrática.

Mesmo sem previsão legal expressa utilizando a nomenclatura latina, os amici curiae vem sendo admitidos pela jurisprudência brasileira há algum tempo, sobretudo nos específicos processos de controle concentrado de constitucionalidade, nos quais a intervenção se fundamenta basicamente nos artigos 7º, § 2º, e 20, § 1º, da Lei Federal nº 9.868/99 (Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI e Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC), e no artigo 5º, § 2º, da Lei Federal nº 9.882/99 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF).

E o Supremo Tribunal Federal parece ter compreendido as inúmeras vantagens de se ter esse respaldo democrático em decisões que tratam de assuntos polêmicos. Basta contar, por exemplo, os diversos amici curiae que participaram da decisão na ADPF 132, que reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar.

O CPC trata especificamente dessa importante figura processual no seu artigo 138, dispondo que:

O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação.

As especificidades aptas a autorizar a presença dos amici curiae em qualquer processo são de três ordens, quais sejam: (i) relevância da matéria, (ii) especificidade do tema objeto da demanda ou (iii) repercussão social da controvérsia. Verifica-se, pois, que se está diante de requisitos bastante subjetivos, que ficarão a cargo do órgão judicial competente (cf., STJ, AgInt no REsp 1614874/SC, 1ª S., j. 13.12.2017, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 19.12.2017).

Ademais, poderão figurar como amici curiae a pessoa natural ou jurídica, além de entidade especializada com representatividade adequada, isto é, que demonstre a relação entre o seu campo de atuação e a questão analisada no bojo do processo, mostrando que possui interesses outros que não os meramente corporativos e que pode contribuir para construção de uma decisão mais acertada e legítima.

Sobre o tema, cabe destacar o Enunciado nº 127 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC): “(art. 138) A representatividade adequada exigida do amicus curiae não pressupõe a concordância unânime daqueles a quem representa”. (Grupo: Litisconsórcio e Intervenção de Terceiros).

Após intimado, o amicus curiae terá 15 dias para participar do processo e, ordinariamente, o fará por meio de manifestação escrita e/ou sustentação oral.

Ainda, o mesmo artigo 138 possui três parágrafos, dispondo, em síntese, que esse tipo de intervenção não altera a competência do órgão julgador, nem autoriza a interposição de recurso pelo amicus curiae, ressalvada a oposição de embargos de declaração e de recurso nas decisões que julgarem incidentes de resolução de demandas repetitivas (v. CPC, arts. 976 e seguintes). Por fim, caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os demais poderes do amicus curiae no processo por decisão irrecorrível (CPC, art. 138, § 1º).