Uma das maiores expectativas em relação ao Código de Processo Civil é, sem dúvida, o seu impacto em relação à uniformização de entendimentos acerca de teses jurídicas.

Sairemos das tramas da conhecida “jurisprudência lotérica”? Conseguiremos encontrar a “fórmula mágica” para unir segurança jurídica, celeridade, efetividade e igualdade processuais? Teremos, enfim, um Poder Judiciário minimamente previsível?

É precisamente dentro desse contexto que se insere o art. 926 do Código, dispondo expressamente que: “Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”.

Desse dispositivo decorrem dois deveres-poderes básicos para os tribunais: (i) uniformizar seus entendimentos (uma vez que o próprio conceito de jurisprudência – prudência do direito – já pressupõe a uniformidade como característica); e (ii) manter a estabilidade, integridade e coerência dessa uniformização.

De nada adianta uniformizar os entendimentos através de súmulas persuasivas, por exemplo, se elas conflitam entre si ou permitem interpretações contraditórias acerca de teses jurídicas que se tangenciam.

A previsibilidade da atuação do Poder Judiciário encontrará, dentro desse cenário, terreno fértil para, de um lado, impedir demandas fundadas em entendimentos já consolidados (em relação aos quais as partes e os advogados saberão, de plano, se ganharão ou perderão determinado litígio; além de possuírem a firme convicção de que esse entendimento consolidado não será alterado pela simples mudança de composição do tribunal) e, de outro, em relação aos aspectos jurídicos, pautar a conduta da sociedade (comportamento humano) em direção àquilo que se entende por correto, justo e honesto, ainda que dentro de um período histórico determinado (tempo e espaço).

Se óbvia é a dinamicidade do fenômeno social, também deveria o ser a necessidade de definição de parâmetros (ainda que transitórios) de conduta humana para evitar o caos em determinada sociedade. E esta é uma função e escopo do direito e do processo (pacificação social).

Os parágrafos do art. 926 do CPC, ainda, aduzem que os tribunais deverão também editar enunciados de súmula que traduzam fielmente os seus entendimentos consolidados (de acordo com os casos concretos que deram origem a cada uniformização).

O art. 927 e suas hipóteses normativas de vinculação, que prometem ainda render inúmeros debates acerca de sua constitucionalidade, parecem rascunhar as bases para o início de uma discussão séria sobre uma teoria brasileira do precedente judicial que, arredia a superficialismos e importações desinteressadas de conceitos dos sistemas de common law, pretende-se autêntica e afinada com a nossa cultura jurídica.

Ressalte-se que o inciso VI, do § 1º, do art. 489 considera não fundamentada qualquer decisão judicial que “deixe de seguir súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso sob julgamento”, ou seja é necessário demonstrar porque determinada situação não “se encaixa” nas orientações já produzidas (distinguishing).

Por fim, cabe destacar o disposto no § 4º do art. 927, segundo o qual: “A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.”.

Podendo, ainda, haver modulação dos efeitos dessa decisão pela superação do entendimento consolidado (§ 3º – overrulling).