O preparo recursal tem a finalidade de suprir as despesas do Poder Judiciário com o processamento dos recursos, sendo que o não recolhimento, quando cabível, pela parte recorrente, implica na sanção processual de deserção, nos termos do art. 1.007 do CPC.
Todavia, não raras vezes, a parte recorrente sofre de enorme insegurança ao realizar o recolhimento das despesas relacionadas ao preparo, tendo em vista o fato de eventual equívoco resultar na inadmissibilidade do recurso e no consequente trânsito em julgado da matéria.
É verdade, por outro lado, que, pautado nos princípios da cooperação entre os sujeitos processuais (art. 6º, CPC), na primazia do julgamento de mérito e na boa-fé processual (art. 5º, CPC), o legislador criou regras a fim de dar a máxima eficiência ao ato processual, permitindo, nos casos de equívoco no recolhimento do preparo, a parte recorrente ser intimada para regularização (art. 1.007, §§ 2º e 4º, CPC).
Com essas premissas em mente, recentemente o STJ analisou questão que envolvia o acerto ou desacerto da decisão que declarou deserto o recurso em que a parte, no momento de recolhimento do preparo, inseriu código do recurso errado e adotou valor superior daquele que realmente deveria recolher.
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do AREsp 1.399.974/DF, entendeu que nas situações em que a parte recolher valor superior do devido, sendo o valor efetivamente revertido aos cofres do tribunal, deve ser afastada a pena de deserção, nos seguintes termos:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. PREPARO. ART. 1.007, § 4º, DO CPC/2015. RECOLHIMENTO A MAIOR COM INDICAÇÃO ERRÔNEA DO RESPECTIVO RECURSO. PENA DE DESERÇÃO. AFASTAMENTO. I – Em consonância com as normas fundamentais previstas nos arts. 5º e 6º do CPC/2015 e com o princípio da instrumentalidade das formas, deve ser afastada a pena de deserção quando o recolhimento do preparo, apesar de ter sido realizado em montante e código diversos do recurso interposto, é realizado a maior, sendo o valor efetivamente revertido aos cofres do tribunal respectivo. Precedente: AgRg no Ag n. 623.371/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ 2/5/2005. II – Em situações semelhantes, o Superior Tribunal de Justiça tem afastado a deserção, apesar da irregularidade da guia de recolhimento, quando se comprova que o preparo foi revertido em favor do Poder Judiciário. Precedentes: AgRg no REsp n. 1.498.568/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe 14/12/2015 e REsp n. 1.498.623/RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 13/3/2015. III – Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial.
Observe-se, caro leitor, que a aplicação do princípio da instrumentalidade das formas, no caso de recolhimento de guia com o código errado, a fim de afastar a deserção recursal, já era entendimento fixado pelo STJ desde o Código de Processo Civil de 1973.
Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. PORTE DE RETORNO E REMESSA. ERRO DE DIGITAÇÃO. RECOLHIMENTO EM CÓDIGO DIVERSO. INAPLICABILIDADE. DESERÇÃO AFASTADA. PRECEDENTES. 1. Agravo regimental contra decisão que proveu agravo de instrumento para relevar a pena de deserção e determinar o retorno dos autos ao Tribunal a quo para fins de que se proceda a um novo juízo de admissibilidade do recurso especial nos demais aspectos. 2. A recorrente efetivou a complementação das custas dentro do prazo determinado, no valor correto, sendo que, na guia com a referida complementação, constou o código de preparo (1505) e não o de porte e remessa e retorno (8021). 3. Realização da complementação do depósito. Inocorrência de prejuízo ocasionado ao Judiciário, que teve as despesas devidamente recolhidas. 4. A jurisprudência desta Corte Superior entende que o fato de haver erro quanto ao código de receita não pode ser levado em consideração para fins de deserção do recurso, caso o valor tenha sido efetuado no prazo legal e no valor exigido. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag 623.371/PR, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/3/2005, DJ 2/5/2005, p. 176)
Desse modo, o entendimento jurisprudencial atual do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o recolhimento do preparo, mesmo que com inserção de código equivocado, desde que efetivamente revertido aos cofres do Poder Judiciário, deve ser considerado e, por consequência, afastada a pena de deserção.
EQUIPE IDC (Luiz Henrique Cezare e Felipe Moreira)