Com a inevitável informatização e modernização que o mundo vem passando ao longo dos últimos anos, o Poder Judiciário, em linha com essa tendência, passou a praticar a maioria dos atos e comunicações processuais por meios eletrônicos, contribuindo para com a agilidade e precisão da prestação jurisdicional.

Ocorre que, com adoção da prática de atos e informações processuais de forma eletrônica, não raras as vezes a parte se depara com informações conflitantes, dificultando sobremaneira a adequada prática de determinados atos processuais, especialmente a interposição de recursos dentro do prazo fixado em lei.

Uma das situações comuns é o caso, por exemplo, de informação de publicação de determinada decisão constante em certidão lançada aos autos – expedida pelo ofício do Juízo, tendo, portanto, fé pública – ser diferente da informação disponibilizada no andamento processual eletrônico veiculado no sítio do respectivo tribunal. Ou seja, caso essas informações sejam conflitantes e a parte seja induzida ao erro na hora de, por exemplo, computar o prazo recursal, qual deveria prevalecer?

Sobre esse tema, em 2019, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do AgInt no AREsp nº 1.455.107/DF, fixou entendimento no sentido de que as informações constantes em certidão emitida pelo tribunal de origem, por serem dotadas de fé pública, deveriam prevalecer em detrimento das informações extraídas no sítio eletrônico do respectivo tribunal para fins de verificação da tempestividade recursal, vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. ARTS. 219, 1.003, § 5º, E 1.070 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.

I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.

II – É intempestivo o Recurso Especial interposto fora do prazo de quinze dias, previsto nos arts. 219, 1.003, § 5º, e 1.070 do estatuto processual civil de 2015.

III – Esta Corte firmou posicionamento segundo o qual as informações constantes em certidão emitida pelo tribunal de origem, por serem dotadas de fé pública, prevalecem sobre aquelas extraídas do sítio oficial do tribunal, do diário oficial ou outro documento equivalente. Precedentes das turmas componentes da 1ª e 2ª Seções deste tribunal.

IV – Não apresentação de argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida.

V – Em regra, descabe a imposição da multa, prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso.

VI – Agravo Interno improvido.

(AgInt no AREsp nº 1.455.107/DF, Rel. Regina Helena Costa, Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, julgado em 12/08/2019, DJe 14/08/2019).

Todavia, enfrentando novamente a questão recentemente, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ao contrário do entendimento anteriormente adotado por algumas turmas da Corte, entendeu que entre as certidões expedidas pelo tribunal e as informações constantes no andamento eletrônico do sítio do tribunal, deve prevalecer esta última para fins de aferição da tempestividade recursal, vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3/STJ. ANDAMENTO PROCESSUAL DISPONIBILIZADO PELA INTERNET. VENCIMENTO DO PRAZO RECURSAL INDICADO DE FORMA EQUIVOCADA NO ANDAMENTO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ERRO ALHEIO À VONTADE DA PARTE. CONSIDERAÇÃO PARA FINS DA CONTAGEM DE PRAZO. POSSIBILIDADE. JUSTA CAUSA PARA PRORROGAÇÃO DO PRAZO RECURSAL. ART. 183, §§ 1º E 2º, DO CPC/1973. PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA CONFIANÇA. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 1. A divulgação do andamento processual pelos Tribunais por meio da internet passou a representar a principal fonte de informação dos advogados em relação aos trâmites do feito. A jurisprudência deve acompanhar a realidade em que se insere, sendo impensável punir a parte que confiou nos dados assim fornecidos pelo próprio Judiciário. Ainda que não se afirme que o prazo correto é aquele erroneamente disponibilizado, desarrazoado frustrar a boa-fé que deve orientar a relação entre os litigantes e o Judiciário. Por essa razão o art. 183, §§ 1º e 2º, do CPC determina o afastamento do rigorismo na contagem dos prazos processuais quando o descumprimento decorrer de fato alheio à vontade da parte. (REsp 1324432/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 17/12/2012, DJe 10/05/2013). 2. Embargos de divergência providos.

(Embargos de Divergência em AREsp nº 688.615/MS, Rel. Mauro Campbell Marques, Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, julgado em 04/03/2020, DJe 09/03/2020).

Portanto, caro leitor, segundo o mais recente entendimento fixado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de embargos de divergência, a tempestividade recursal pode ser aferida, excepcionalmente, por meio de informação constante em andamento processual disponibilizado no sítio eletrônico, quando informação equivocadamente disponibilizada pelo Tribunal de origem induz a parte em erro.

EQUIPE IDC (Luiz Cezare e Felipe Moreira)