De acordo com o art. 523, caput, do CPC, o devedor terá o prazo de 15 (quinze) dias para cumprimento voluntário da obrigação de pagar, sob pena de incidência de multa de 10% (dez por cento) e honorários advocatícios no mesmo percentual. Além disso, poderá apresentar impugnação ao cumprimento de sentença no prazo de 15 (quinze) dias, contados do término do prazo para cumprimento voluntário.

Como o prazo para impugnação começa a fluir após o término do prazo para cumprimento voluntário (prazos sucessivos), não são raras as situações nas quais o devedor opta por depositar em juízo o valor integral da dívida, a fim de evitar os encargos previstos no art. 523, §1º, do CPC, para posterior apresentação de impugnação ao cumprimento de sentença.

A questão que se coloca é a seguinte: caso o devedor, ao ser intimado para cumprir voluntariamente a obrigação, deposita nos autos o valor integral da dívida com o objetivo de evitar a incidência de multa e honorários e deixa de apresentar posterior impugnação ao cumprimento de sentença, esse depósito feito será considerado pagamento ou garantia do juízo? Em outras palavras: haverá ou não incidência de multa?

Em recente julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, julgando o REsp nº 1.834.337/SP, entendeu inadmissível a incidência de multa e honorários advocatícios nessa situação, vejamos:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL EM FASE DE CUMPRIMENTO DEFINITIVO DE SENTENÇA QUE RECONHECE A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA. PAGAMENTO VOLUNTÁRIO. INCIDÊNCIA DE MULTA. CRITÉRIOS. INTEMPESTIVIDADE. RESISTÊNCIA MEDIANTE IMPUGNAÇÃO. DEPÓSITO INTEGRAL NO PRAZO DE 15 DIAS ÚTEIS SEM RESISTÊNCIA DA PARTE EXECUTADA. NÃO APLICAÇÃO DA MULTA.

  1. Ação ajuizada em 2/5/17. Recurso especial interposto em 28/5/18. Autos conclusos ao gabinete em 28/6/19. Julgamento: CPC/15.
  2. O propósito recursal consiste em dizer da violação do art. 523, §1º, do CPC/15, acerca do critério de quando deve incidir, ou não, a multa de dez por cento sobre o débito, além de dez por cento de honorários advocatícios.
  3. São dois os critérios a dizer da incidência da multa prevista no art. 523, §1º, do CPC, a intempestividade do pagamento ou a resistência manifestada na fase de cumprimento de sentença.
  4. Considerando o caráter coercitivo da multa, a desestimular comportamentos exclusivamente baseados na protelação da satisfação do débito perseguido, não há de se admitir sua aplicação para o devedor que efetivamente faz o depósito integral da quantia dentro do prazo legal e não apresenta impugnação ao cumprimento de sentença.
  5. Na hipótese dos autos, apesar de advertir sobre o pretendido efeito suspensivo e da garantia do juízo, é incontroverso que a executada realizou tempestivamente o depósito integral da quantia perseguida e não apresentou impugnação ao cumprimento de sentença, fato que revela, indene de dúvidas, que houve verdadeiro pagamento do débito, inclusive com o respectivo levantamento pela exequente. Não incidência da multa prevista no art. 523, §1º, do CPC e correta extinção do processo, na forma do art. 924, II, do CPC. 6. Recurso especial conhecido e não provido.

(REsp nº 1.834.337/SP, Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe do dia 05/12/2019).

Importante consignarmos que referido entendimento se deu em razão de o depósito realizado pelo devedor ter sido considerado pagamento voluntário, tendo em vista a ausência de apresentação da respectiva impugnação. Caso contrário, ou seja, caso o devedor apresente defesa, a mesma Corte já entendeu que haverá incidência da multa, por se tratar de depósito feito em garantia do juízo, e não pagamento voluntário:

RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE ADIMPLEMENTO CONTRATUAL – FASE DE IMPUGNAÇÃO A CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – ACÓRDÃO LOCAL DETERMINANDO A EXCLUSÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 475-J DO CPC. INSURGÊNCIA DO EXEQUENTE. 1. Não conhecimento do recurso especial no tocante à sua interposição pela alínea “c” do art. 105, III, da CF. Cotejo analítico não realizado, sendo insuficiente para satisfazer a exigência mera transcrição de ementas dos acórdãos apontados como paradigmas. 2. Violação ao art. 535 do CPC não configurada. Corte de origem que enfrentou todos os aspectos essenciais ao julgamento da lide, sobrevindo, contudo, conclusão diversa à almejada pela parte. 3. Afronta ao art. 475-J do CPC evidenciada. A atitude do devedor, que promove o mero depósito judicial do quantum exequendo, com finalidade de permitir a oposição de impugnação ao cumprimento de sentença, não perfaz adimplemento voluntário da obrigação, autorizando o cômputo da sanção de 10% sobre o saldo devedor. A satisfação da obrigação creditícia somente ocorre quando o valor a ela correspondente ingressa no campo de disponibilidade do exequente; permanecendo o valor em conta judicial, ou mesmo indisponível ao credor, por opção do devedor, por evidente, mantém-se o inadimplemento da prestação de pagar quantia certa. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido em parte.

(REsp 1.175.763/RS, Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Rel. Marco Buzzi, DJe 05/10/2012).

Desse modo, caro leitor, por se tratar de medida coercitiva, que visa evitar práticas protelatórias, a multa e os honorários previstos no art. 523, §1º, do CPC, não terão incidência caso o devedor deposite o valor devido nos autos e deixe de apresentar a respectiva impugnação ao cumprimento de sentença, conforme entendimento recente do Superior Tribunal de Justiça.

EQUIPE IDC (Luiz Cezare e Felipe Moreira)