RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMPROVANTE DE OPERAÇÕES FINANCEIRAS. EMISSÃO EM PAPEL TERMOSSENSÍVEL. BAIXA DURABILIDADE. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DEFICIENTE. OBRIGAÇÃO DE EMISSÃO GRATUITA DE SEGUNDA VIA DO COMPROVANTE.
- O Código de Defesa do Consumidor, para além da responsabilidade decorrente dos acidentes de consumo (arts. 12 a 17), cuja preocupação primordial é a segurança física e patrimonial do consumidor, regulamentou também a responsabilidade pelo vício do produto ou do serviço (arts. 18 a 25), em que a atenção se voltou à análise da efetiva adequação à finalidade a que se destina. Previu, assim, que o fornecedor responderá pelos vícios de qualidade que tornem os serviços impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor ou, ainda, pelos decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou da mensagem publicitária (art. 20).
- A noção de vício passou a ser objetivada, tendo a norma trazido parâmetros a serem observados, independentemente do que fora disposto no contrato, além de ter estabelecido um novo dever jurídico ao fornecedor: o dever de qualidade e funcionalidade, a ser analisado de acordo com as circunstâncias do caso concreto, devendo-se ter em conta ainda a efetiva adequação à finalidade a que se destina e às expectativas legítimas do consumidor com aquele serviço, bem como se se trata de obrigação de meio ou de resultado.
- A instituição financeira, ao emitir comprovantes de suas operações por meio de papel termossensível, acabou atraindo para si a responsabilidade pelo vício de qualidade do produto. Isso porque, por sua própria escolha, em troca do aumento dos lucros – já que a impressão no papel térmico é mais rápida e bem mais em conta -, passou a ofertar o serviço de forma inadequada, emitindo comprovantes cuja durabilidade não atendem as exigências e as necessidades do consumidor, vulnerando o princípio da confiança.
- É da natureza específica do tipo de serviço prestado emitir documentos de longa vida útil, a permitir que os consumidores possam, quando lhes for exigido, comprovar as operações realizadas. Em verdade, a “fragilidade” dos documentos emitidos em papel termossensível acaba por ampliar o desequilíbrio na relação de consumo, em vista da dificuldade que o consumidor terá em comprovar o seu direito pelo desbotamento das informações no comprovante.
- Condicionar a durabilidade de um comprovante às suas condições de armazenamento, além de incompatível com a segurança e a qualidade que se exigem da prestação de serviços, torna a relação excessivamente onerosa para o consumidor, que, além dos custos de emitir um novo recibo em outra forma de impressão (fotocópia), teria o ônus de arcar, em caso de perda, com uma nova tarifa pela emissão da 2ª via do recibo, o que se mostra abusivo e desproporcional.
- O reconhecimento da falha do serviço não pode importar, por outro lado, em repasse pelo aumento de tarifa ao consumidor nem em prejuízos ao meio ambiente.
- Na hipótese, o serviço disponibilizado foi inadequado e ineficiente, porquanto incidente na frustração da legítima expectativa de qualidade e funcionalidade do consumidor-médio em relação ao esmaecimento prematuro das impressões em papel térmico, concretizando-se o nexo de imputação na frustração da confiança a que fora induzido o cliente.
8. Recurso especial não provido.
(STJ, REsp nº 1.414.774/RJ, 4ª T., j. 16.05.2019, rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJe 05.06.2019)