Uma das discussões mais importantes que permeia o CPC/15 diz respeito às situações nas quais a contagem dos prazos em dias úteis seria aplicável (art. 219).
Dentre essas hipóteses, sempre se questionou se o prazo de 15 (quinze) dias para cumprimento voluntário da obrigação de pagar, previsto no art. 523 do Código, teria natureza processual ou material e, por consequência, se a sua contagem deveria ser em dias úteis ou corridos. Por óbvio, a contagem em dias corridos sempre foi a mais segura, razão pela qual é a recomendada em caso de dúvida.
Sobre esse tema, a recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está se consolidando no sentido de que o prazo para pagamento voluntário deverá ser contado em dias úteis, vejamos:
RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO DEVEDOR PARA PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DO DÉBITO. ART. 523, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. PRAZO DE NATUREZA PROCESSUAL. CONTAGEM EM DIAS ÚTEIS, NA FORMA DO ART. 219 DO CPC/2015. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO PROVIDO.
1. Cinge-se a controvérsia a definir se o prazo para o cumprimento voluntário da obrigação, previsto no art. 523, caput, do Código de Processo Civil de 2015, possui natureza processual ou material, a fim de estabelecer se a sua contagem se dará, respectivamente, em dias úteis ou corridos, a teor do que dispõe o art. 219, caput e parágrafo único, do CPC/2015.
(…)
3. Conquanto o pagamento seja ato a ser praticado pela parte, a intimação para o cumprimento voluntário da sentença ocorre, como regra, na pessoa do advogado constituído nos autos (CPC/2015, art. 513, § 2º, I), fato que, inevitavelmente, acarreta um ônus ao causídico, o qual deverá comunicar ao seu cliente não só o resultado desfavorável da demanda, como também as próprias consequências jurídicas da ausência de cumprimento da sentença no respectivo prazo legal.
3.1. Ademais, nos termos do art. 525 do CPC/2015, “transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação”. Assim, não seria razoável fazer a contagem dos primeiros 15 (quinze) dias para o pagamento voluntário do débito em dias corridos, se considerar o prazo de natureza material, e, após o transcurso desse prazo, contar os 15 (quinze) dias subsequentes, para a apresentação da impugnação, em dias úteis, por se tratar de prazo processual.
3.2. Não se pode ignorar, ainda, que a intimação para o cumprimento de sentença, independentemente de quem seja o destinatário, tem como finalidade a prática de um ato processual, pois, além de estar previsto na própria legislação processual (CPC), também traz consequências para o processo, caso não seja adimplido o débito no prazo legal, tais como a incidência de multa, fixação de honorários advocatícios, possibilidade de penhora de bens e valores, início do prazo para impugnação ao cumprimento de sentença, dentre outras. E, sendo um ato processual, o respectivo prazo, por decorrência lógica, terá a mesma natureza jurídica, o que faz incidir a norma do art. 219 do CPC/2015, que determina a contagem em dias úteis.
4. Em análise do tema, a I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal – CJF aprovou o Enunciado n. 89, de seguinte teor: “Conta-se em dias úteis o prazo do caput do art. 523 do CPC”. 5. Recurso especial provido.
(STJ, REsp nº 1.708.348/RJ, 3ª T., j. 25.06.2019, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 01.08.2019).
Mesmo com esse movimento de sedimentação de entendimento jurisprudencial pelo STJ, é cediço, caro leitor, que não raras vezes os tribunais locais não acompanham a jurisprudência da Corte Superior até a efetiva fixação de tese em precedente vinculante. A título de exemplo, veja-se recente julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo aplicando a contagem em dias corridos para pagamento voluntário:
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TERMO DE 15 DIAS PARA PAGAMENTO VOLUNTÁRIO – PRAZO MATERIAL – CONTAGEM EM DIAS CORRIDOS – ATO A SER REALIZADO PELA PARTE – DECISÃO MANTIDA – AGRAVO IMPROVIDO.
(Agravo de Instrumento nº 2087420-48.2019.8.26.0000, 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, j. 28.05.2019, rel. Des. Giffoni Ferreira, DJe 28.05.2019)
Portanto, a despeito de a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estar se consolidando sobre o tema, a contagem do prazo para pagamento voluntário ainda exige cautela, principalmente para evitar que encargos sejam inseridos no valor da condenação em função de eventual entendimento de pagamento extemporâneo.
EQUIPE IDC (Luiz Henrique Cezare e Felipe Moreira)